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Entrevista a Loukianos Stathopoulos



Tens estudado o reformismo e o euro-comunismo. Que opinião tens acerca destes dois temas? Como têm sido trágicos para o progresso do comunismo e para o combate total ao capitalismo e fascismo? Um dia perguntei ao camarada Carlos Costa qual é o futuro do PCP. Ele respondeu o futuro és tu, o futuro são vocês, os jovens. Insisti na pergunta, mas que futuro tem a actual direcção do PCP em particular e ele respondeu: nenhum, como comunistas não têm futuro nenhum.

E eu acrescento hoje: que futuro pode ter uma direcção social-democrata num partido chamado comunista?

São dois elementos incompatíveis e isso só pode levar a desaparecer essa direcção em particular ou o partido. Eu confio que em qualquer dos casos os verdadeiros comunistas portugueses saberão reorganizar o seu partido comunista à medida que tivermos a humildade de voltar a estudar e a assimilar correctamente os livros de Marx, Engels, Lenine e Stalin e de dar ouvidos a camaradas como o Carlos Costa. O que podemos e devemos aprender sobre o fascismo/Estado Novo, o 25 de Abril e o 25 de Novembro? Esses são os acontecimentos históricos de Portugal essenciais para a história do PCP e com eles podemos aprender pilares fundamentais de uma linha política marxista-leninista, digna de um verdadeiro Partido Comunista. Mas só o podemos fazer realmente se tivermos a humildade e a honestidade de assumirmos que cometemos erros em toda essa trajectória e que esses erros não foram todos corrigidos e muitos erros não foram sequer identificados ainda. Aqui tenho de fazer um parêntesis para dizer que a minha opinião sobre estes temas é tão pessoal que é quase escusado dizê-lo. O meu objectivo de vida não é lucrar com as minhas opiniões, eu sinto até repulsa por aqueles intelectuais que são mais vendedores de livros do que reprodutores de conhecimento. As minhas opiniões não são o meu sustento nem o meu modo de vida. Por outro lado eu não sou um daqueles intelectuais e artistas da torre de marfim que se satisfazem a si próprios por terem a verdade. O meu objectivo com a minha escrita é fazer com que os meus camaradas e os meus leitores em primeiro lugar aprendam a pensar de forma marxista-leninista (não se pode ter um ponto de vista comunista verdadeiro sem estudar os livros de Marx e Lenine e sem assimilar os seus métodos e a sua ciência) e em segundo lugar convencer os meus camaradas e os meus leitores que as minhas opiniões são as mais correctas. Em poucas palavras o meu objectivo é não apenas um melhoria nas condições de vida para mim ou para apenas uma parte dos trabalhadores mas sim o derrube revolucionário do capitalismo, a revolução socialista, como única garantia de uma sociedade nova que é a única garantia de boas condições de vida para toda a humanidade - o fim da exploração do trabalho, uma sociedade de trabalhadores livres e iguais. Quando um camarada chega a conclusões diferentes das minhas sobre a história do PCP com pleno conhecimento dos livros de Marx e de Lenine, se eu contribui para esse conhecimento dos livros de Marx e de Lenine já me dou por satisfeito mesmo que a minha divergência com esse camarada nunca seja superada. Eu parto do príncipio que num Partido Comunista com milhares de pessoas (ou mesmo num Partido Comunista apenas com centenas de pessoas) em que todos os militantes estudam os livros de Marx e de Lenine, e dessa forma têm um pleno conhecimento da ciência marxista-leninista, a formação da opinião correcta, do programa estratégico à linha política táctica e o seu desdobramento nas directivas práticas e organizacionais, estão práticamente garantidas. É falsa a ideia de que o estudo dos livros de Marx e de Lenine leva ao fechamento num círculo de tertúlias intelectuais. O estudo correcto dos livros de Marx e de Lenine só pode levar à sua aplicação prática correcta em simultâneo com o seu estudo. Se é verdade que há grupos que se diziam marxistas que degeneraram nesse círculo de tertúlias intelectuais isso é precisamente porque lhes faltou humildade para estudar e assimilar os livros de Marx e de Lenine e a experiência mostra como esses grupos se afastaram do marxismo-leninismo e se dedicaram a inventar teorias que querendo passar por "novas" de facto regressavam a velhos trotskismos, euro-comunismos e todo o tipo de oportunismos "anti-estalinistas". Na realidade é bem mais nefasta a crítica desonesta ao "teoricismo" que repudia a leitura e estudo dos livros de Marx e Lenine do que a influência por natureza muito marginal desses grupos pseudo-marxistas que se fecharam em si mesmos dentro das suas fantasias alheias ao marxismo-leninismo (e é um facto que esses grupos nunca promoveram de facto verdadeiros círculos de estudo dos livros de Marx e Lenine, nem entre intelectuais e muito menos com operários). No teu perfil do facebook falaste sobre o Maio de 68 e que este não tornou o PCF um partido Marxista- Leninista, antes pelo contrário. Sobre o Chile, a mesma posição. O que nos podes falar sobre esta afirmação? O rumo do PCF já estava traçado antes do Maio de 68 tal como hoje o rumo do Partido Comunista do Chile já está traçado há décadas. A história do Partido Comunista Italiano escrita pelo seu sucessor (o Partido Comunista, Itália) é reveladora do que aconteceu em França ao PCF. Em Itália a incapacidade do movimento comunista internacional e em particular da maioria que prevaleceu dentro do PCI de estabelecer limites à táctica da Frente Popular (que se devia limitar únicamente ao tempo de guerra contra a Alemanha nazi e à derrota do fascismo na Itália) levou a que o líder do PCI Togliatti (também pelas limitações dele e do seu grupo dirigente) formulasse o caminho para o socialismo como uma luta eleitoral e parlamentar em que básicamente se transformava o Estado capitalista em socialista ganhando a maioria num parlamento burguês e formando um governo que básicamente reformaria o capitalismo transformando-o em socialismo - estas teses foram promovidas no pós-guerra como resposta a uma suposta nova situação, colocando em causa a definição marxista de Estado que nada tem a ver com qualquer "situação nova".

O trabalho histórico sobre a Itália e o PCI é revelador porque já está muito bem desenvolvido pelos camaradas do PC(Itália) e eu posso afirmar que assenta que nem uma luva à França e ao PCF. Em síntese o que os meus estudos sobre o PCF indicam - apesar de ainda faltar um trabalho histórico de fundo sobre a história do PCF em particular - é que basta substituir o nome de Togliatti por Maurice Thorez e acrescentar mais uns pequenos detalhes menores e a história até 68 foi a mesma. Em 1968 em França e em Itália os secretários-gerais do PCF e do PCI estavam já numa fase de preparação para a ruptura com a União Soviética que seria concretizada pelos seus sucessores (Marchais e Berlinguer) guiados pelo conceito de "euro-comunismo". Nós marxistas-leninistas acreditamos que uma revolução socialista precisa de ser dirigida pelo Partido Comunista para poder vencer. Em França em 1968 criou-se um movimento de massas espontâneo, como é natural nos movimentos de massas, e muita gente viu trabalhadores e estudantes a radicalizarem-se a tal ponto que se chamou de situação revolucionária àquela luta (que envolveu greves, manifestações, ocupações de fábricas e universidades, etc). Mais importante que julgarmos se a situação era revolucionária ou não, é percebermos que a reacção do PCF foi a reacção de um autêntico bombeiro de serviço, a colocar paninhos quentes, a apelar à calma e a propor que tudo se resolvesse por eleições burguesas e com um novo governo. Naturalmente como o Marxismo prevê rigorosamente as greves alcançaram conquistas de direitos e aumentos de salários que mais tarde foram roubados - hoje na França pode-se dizer que os trabalhadores e os estudantes estão em pior situação económica e social que antes do Maio de 68, tudo o que foi ganho foi perdido em dobro. O PCF salvou o capitalismo francês em 68, independentemente de quaisquer defeitos que o próprio movimento de massas de 68 tivesse (e tinha de facto) o facto crucial é que os trabalhadores e os estudantes não tinham o seu partido revolucionário, as massas não tinham o seu Estado-maior da revolução. E ainda pior é que se identificavam no PCF o seu partido de classe proletário sem perceber que o partido os estava a enganar e os estava a trair. O Chile é exemplo de tudo o que eu falei só que com um preciosismo que o torna ainda mais enganador. Também na França e na Itália podemos nos perguntar até que ponto a deturpação do Marxismo pelos dirigentes do PCF e do PCI foi consciente ou ingénua e certamente que até ao surgir do euro-comunismo esta tese da via parlamentar e pacífica (eleitoral) para o socialismo foi largamente ingénua, mas o facto é que o resultado de seguir esta linha política consciente ou ingénuamente é o mesmo: recuperação total dos capitalistas de tudo o que tiveram de ceder e agravamento da exploração dos trabalhadores.

O Partido Comunista do Chile actual é o produto ideológico da completa incapacidade de aprender alguma coisa com o fracasso do governo de Salvador Allende em 1973. E 1973 o governo de Salvador Allende foi violentamente deposto e seguiu-se um massacre genocida (em que o próprio Allende morre) por obra da maioria fascista do exército burguês Chileno com o apoio da CIA e do governo dos Estados Unidos. Aquilo que o PC do Chile não é capaz de ver é que esta foi a reacção natural da burguesia e do Estado burguês Chileno perante um governo que prometia um socialismo "pacífico" (e de facto não-revolucionário), este governo não era uma ameaça existencial ao capitalismo Chileno, ele era apenas um estorvo aos planos da burguesia e tal como um mero estorvo ele foi varrido como se varre uma melga a pairar sobre a cabeça, com toda a facilidade. Uma vez imposto o Estado fascista de Pinochet o PC do Chile passou à clandestinidade e a melhor parte dos seus quadros optaram pela luta armada, mas como a luta armada era uma contradição aberta com o delirante socialismo "pacífico" de Allende que o PC do Chile apoiou com unhas e dentes a Frente Patriótica Manuel Rodriguez (o braço armado dos comunistas Chilenos) acabou por entrar em colisão com o PC do Chile e formou um partido à parte em 1986. Essa cisão é a saída do que restava de Marxismo no PC do Chile. A partir daí o PC do Chile voltou à carga com a via eleitoral para o socialismo com o regresso da democracia burguesa ao Chile nos anos 90 enconstando-se cada vez mais ao Partido Socialista do Chile, que apesar de ter sido o partido de Allende já tinha abandonado qualquer pretensão de socialismo mesmo pela via "pacífica". O PC do Chile hoje faz as vezes de Allende e mantém acesa a ilusão da via eleitoral para o socialismo, mas em 1973 restava algo de marxismo no PC do Chile e restava algo de "desejo" de socialismo no delirante Allende e no seu Partido Socialista enquanto hoje o Marxismo do PC do Chile já foi todo borda fora e o PS do Chile já enviou os seus delírios allendistas também borda fora tornando-se num verdadeiro partido burguês social-democrata (mais liberal que os liberais) tal como o nosso PS português.

Pois é claro que deturpar o Marxismo só pode resultar no fracasso do objectivo revolucionário e socialista do Marxismo. A situação Chile no hoje é como todos sabemos uma situação em que existe um grande movimento de massas radicalizado, mas já ultrapassou o Maio de 68? Nem por sombras. O pior não é isso, o pior é que mesmo que ultrapasse e haja o que houver na radicalização do movimento a questão da ausência de um partido comunista revolucionário sente-se no Chile com tanta ou mais gravidade do que se sentiu no Maio de 68. O facto de olharmos para a ingenuidade de Allende com condescendência não nos ajuda a corrigir os nossos erros. Cabe aos Marxistas do Chile, hoje divididos em vários grupos da Frente Patriótica Manuel Rodriguez, retomarem a necessária construção do Partido Comunista, com uma estratégia de via revolucionária e não de via eleitoral. Apoiaste o manifesto dos comunistas contra a geringonça, já me referiste por diversas vezes sobre o reformismo português e brasileiro. Para ti o que tem levado a este processo reformista internacional? Como achas que é possível reverter todo este processo oportunista? Esse manifesto diz respeito às posições políticas do grupo de pessoas que o assinou. Eu identifico-me plenamente com ele mas não falo em nome desse manifesto e desse grupo de comunistas. Apenas digo que é evidente que a força desse manifesto está precisamente no facto de ele representar as posições políticas de um grupo de comunistas e não uma opinião individual (como é a minha em todas estas respostas da entrevista) - quando digo isto não estou a dar uma opinião mas sim a constatar um facto. Posso dizer também que acredito que este manifesto representa no essencial e por vezes integralmente também a opinião de muitos comunistas dentro e fora do PCP (muitos mais do que os que o assinaram) mas aí sim estou apenas a dar a minha opinião. O que tem levado ao fortalecimento do reformismo dentro de partidos comunistas em Portugal e no Brasil são erros que se têm acumulado e que com o tempo levam à derrota dos revolucionários nos seus próprios partidos comunistas que são tomados por correntes reformistas. É a falta de auto-crítica, é a falta de capacidade de aprender com os erros e com a experiência histórica que faz com que os erros dos comunistas não só se acumulem como também claramente se repitam. Na corrente do Maoísmo surgiram tendências saídas de dentro dos partidos comunistas históricos do Brasil e de Portugal (PCB e PCP) que depois adoptaram uma linha política crítica do Maoísmo pró-albanesa, falo históricamente do PCdoB a partir dos anos 60 e da UDP nos anos 70, e essa viragem da China para a Albânia foi positiva em reconhecer elementos oportunistas do Maoísmo que realmente levaram a China a ser não um pólo contra o revisionismo mas sim um pólo de aliança com os EUA contra a URSS. Mas a corrente pró-albanesa teve os seus próprios defeitos que levaram à completa adaptação do PCdoB e da UDP ao capitalismo como partidos sociais-democratas, ambos cresceram como partidos parlamentares e como organizações na base da sua social-democratização. No Brasil foi possível manter uma minoria dessa tendência pró-albanesa fiel aos seus postulados ideológicos originais no PCR (Partido Comunista Revolucionário) e este é um partido comunista que eu respeito mas com quem eu tenho certas divergências - respeito muito o seu trabalho de defesa de Stalin mas tenho dúvidas sobre alguns aspectos da sua política nacional e internacional.

Em relação ao PCP e ao PCB históricos que se mantém até hoje tenho opiniões mais profundas e também uma maior noção das minhas lacunas no estudo da história desses partidos. Comecemos pelo PCB, alguns aspectos fundamentais do PCB durante este século são a sua natureza eclética e a sua crítica à política do velho PCB (aquele que acabou em 1991 transformado-se em PPS) de aliança com a burguesia nacional. O ecletismo do PCB, a sua permissão implícita de diferentes tendências, é querer ser a "casa comum dos comunistas" mas na verdade isto significa muitas vezes a incapacidade de ter posições firmes e claras, posições do partido todo, sobre questões importantes. Veja-se então a crítica à aliança com a burguesia nacional, é uma aplicação correcta desta crítica que o PCB tenha retirado apoio ao governo do PT de Lula em 2004 ou 2005 mas em tempos recentes a pretexto da luta contra o governo de Bolsonaro vemos de novo o PCB a assinar manifestos com o PT e a tentar unir uma oposição de esquerda que une com o PT enquanto o PT procura unir este chamado campo anti-fascista com liberais de direita como Fernando Henrique Cardoso e outros.

Quanto mais o PCB tenta puxar o PT para a esquerda mais acontece apenas que PT arrasta o PCB para a direita. Falta clareza à crítica da aliança com a burguesia nacional a quem não reconhece o PT como um partido da burguesia. É correcta a ideia de separar a base do PT da sua cúpula mas isso não é possível com manifestos comuns e com frentes formadas por partidos. Se o PCB quer ganhar a hegemonia contra o PT ele tem de unir as massas pela base, pelas organizações sociais e não pela colaboração entre partidos que inclui o PT e outros partidos burgueses e pequeno-burgueses. Mas o PCB por força do seu ecletismo não parece ter respostas claras e firmes e por isso também tem dificuldade em ser reconhecido como alternativa ao PT e então desmoraliza-se e mantém-se numa vã procura de puxar o PT para a esquerda. Só há uma maneira de puxar o PT para a esquerda, acabar com o PT e converter os seus apoiantes em apoiantes dos comunistas ou até mesmo em militantes comunistas. O PT não tem maneira de ser puxado para a esquerda, ele é um problema social-democrata que ou cresce ou se esvazia. Quem acredita que a única escolha é Bolsonaro ou o PT com certeza que desistiu de desenvolver um partido comunista e mantém a aliança com a burguesia nacional. Por vezes fala-se de acordos pontuais de partidos comunistas com a social-democracia por exemplo para justificar manifestos anti-fascistas contra Bolsonaro do PCB com o PT ou a posição conjunta do PCP com o PS, mas estes exemplos não são acordos pontuais de propostas concretas como a votação da subida de salários mínimos ou de trabalhadores do Estado, estes exemplos são meras proclamações de promessas que nunca foram cumpridas. O caso do PCP aqui é claramente pior, o PCB promoveu uma tentativa de articular uma oposição de esquerda a Bolsonaro esperando em vão que o PT não se unisse à direita de Fernando Henrique Cardoso e do PMDB como sempre fez e assim o PCB negou-se a encarar a realidade que o PT é um partido burguês irrecuperável mesmo quando é oposição a outro governo burguês (e negou-se a aprender com história que já tinha provado isso sobre o PT), mas o PCP ao apoiar um governo do PS e ao afirmar mentirosamente que as suas promessas foram cumpridas como o fez em relação ao "cancelamento da privatização dos transportes" (que de facto não aconteceu na CP Carga e na TAP) contribuiu directamente para o agravamento da exploração capitalista e para a destruição da sua independência de classe tornando-se num partido de suporte da social-democracia e de governos burgueses. O PCP tem vindo a aprovar orçamentos de Estado do PS já por dois mandatos de governo consecutivos do PS e ao fazê-lo admite cada vez mais claramente que considera uma melhoria na vida dos trabalhadores que se entregue migalhas aos trabalhadores que são completamente ultrapassadas pelo aumento do custo de vida enquanto se entrega milhões e mais milhões de euros aos bancos e aos patrões. Ao vangloriar-se pelas migalhas oferecidas aos trabalhadores pelo governo do PS o PCP promove uma charlatanice e torna-se aquilo que Álvaro Cunhal criticou muito bem nos "renovadores" de 2001/2002, isto é o "grilo falante do PS". Como é possível reverter todo este processo oportunista? Eu tenho o maior respeito e interesse em que os mais diversos camaradas que reconhecem o nosso problema de desvio de direita no PCP apresentem soluções para este problema, eu individualmente tenho ideias de sobra de como solucionar este problema mas não me encerro nessa auto-satisfação, eu sei que as minhas ideias por muito boas que sejam de nada valem se eu estiver a aplicá-las sozinho e sei que se eu não estiver sozinho e se formos capazes de vencer esta direcção do PCP que se rendeu ao PS teremos de assumir grandes responsabilidades de liderança e isso implica enfrentar problemas e desafios que eu nunca poderia resolver sozinho nem mesmo apenas teóricamente e conceptualmente e muito menos na prática. Além disso é fundamental termos esta mesma atitude a nível internacional na nossa relação com o movimento comunista internacional, devemos aprender uns com os outros entre partidos comunistas revolucionários que se opõem à social-democracia e devemos ao mesmo tempo reconhecer a necessidade da revolução socialista a nível nacional e também a simultânea necessidade de cooperação constante dos partidos comunistas contra esta união imperialista da UE. Eu apoio completamente os passos dados para a criação de uma estratégia revolucionária unificada pelos partidos comunistas que dinamizam a Iniciativa Comunista Europeia e a Revista Comunista Internacional. Esta estratégia revolucionária internacional em Portugal passa claramente por rejeitar o programa da Democracia Avançada do PCP (que não é mais que a cópia do programa do PCF do mesmo nome de 1968 passados 20 anos) e adoptar um programa para a revolução socialista em Portugal sem etapas intermédias entre capitalismo e socialismo. Em termos de teoria Marxista-Lenista, que é a maior das fraquezas do PCP, criar um programa revolucionário é um ponto de partida e outro ponto de partida é criar uma formação ideológica obrigatória para todos os militantes e a obrigação da discussão estar aberta nas bases de forma permanente. Como disse o manifesto dos comunistas contra a geringonça muito bem tudo isto desapareceu do PCP, não há formação ideológica e não há bases, há dirigentes que se dirigem e elegem a si mesmos, chegando até a cancelar eleições de delegados ao congresso que não lhes convinham (como aconteceu ao camarada Guilherme Antunes). Há muitos outros problemas além destes que eu mencionei, o manifesto dos comunistas contra a geringonça mostra uma boa parte deles. Dentro e fora do PCP os comunistas honestos têm de se unir, decidir e levar a cabo aquilo que é uma alternativa comunista à social-democracia e ao revisionismo que os dirige. Qual é a tua opinião sobre o XXº Congresso no que se refere à ex-URSS e sobre o resultado da política seguida a partir deste Congresso? Acreditas que uma reflexão e análise séria pode ser uma mais-valia para se compreender a grave situação do movimento comunista internacional? O XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) em 1956 foi a origem da viragem revisionista na direcção do PCUS e da URSS e por consequência na maioria desse partido e nos órgãos dirigentes do Estado Soviético, foi isto que disse o camarada histórico dirigente do PCP Carlos Costa estando eu a citar de memória e sem me lembrar das palavras exactas. Foi com o camarada Carlos Costa e com os seus livros que eu aprendi os fundamentos desta viragem histórica do PCUS e da URSS. Desde aí eu percebi que a política de Khruschev foi abertamente promovida e imposta como política mundial de todo o movimento comunista internacional apesar de falsamente identificar uma diversidade de vias para o socialismo de acordo com cada país, a prática demonstrou como a política de coexistência pacífica entre socialismo e imperialismo e da via pacífica e parlamentar para o socialismo defendidas pelo PCUS liderado por Khruschev foram impostas aos partidos comunistas de todo o mundo. A esse respeito recomendo a leitura do livro do camarada Ludo Martens "Um Outro Olhar sobre Stalin", do livro a "História do PCUS (Bolchevique)" de 1938 de redacção colectiva que inclui o camarada Stalin e do livro "Princípios do Leninismo" do camarada Stalin, para perceber as mentiras de Khruchev sobre o camarada Stalin. Um outro livro recomendável é exactamente chamado "As mentiras de Khruchev" do camarada Grover Furr. São livros que eu conheci particularmente com o contributo intelectual revolucionário do camarada Carlos Costa. Além de comprar estes livros em papel todos os camaradas e amigos podem encontrar livros como estes e outros textos relacionados em sites como o "Para a história do socialismo", o blog "pelo socialismo", o site associação Iskra e no blog "pelo anti-imperialismo". Depois das leituras de que eu falei eu estudei trabalhos que se podem consultar no blog "pelo anti-imperialismo" e em alguns dos outros sites que foram feitos pelo Partido Comunista da Grécia (KKE) em que se destacam principalmente as "Teses sobre o Socialismo" do KKE que foi um balanço histórico da URSS aprovado por um congresso do KKE e o livro do KKE "Assuntos teóricos sobre o programa do KKE" que a meu ver desenvolve ainda mais esses estudos. Eu estou a mencionar aqui todas estas referências de estudo porque na minha opinião elas respondem a esta tua pergunta muito melhor do que eu poderei fazer e porque eu continuo a estudar estas referências precisamente para reforçar a minha capacidade de responder à tua pergunta. Tens trabalhado sobre a história e o processo de luta do KKE e viveste e trabalhaste algum tempo na Grécia e pudeste ver no terreno o KKE e tens seguido e já entrevistaste responsáveis da nova organização comunista alemã Kommunistische Organisation. O que tens aprendido com o trabalho do KKE e da Kommunistische Organisation? Tens também estudado o movimento comunista português e internacional desde a sua génese. Para ti, trabalhar a obra destes partidos, e do movimento português e internacional como é que pode ser uma aprendizagem em termos políticos, culturais e marxistas-leninistas? Vivi na Grécia durante uns 4 ou 5 meses divididas por 3 viagens, entre 2014 e 2017 salvo erro. Conheci a Grécia continental e as suas famosas ilhas. Estive na capital Atenas, na cidade de Patras e na ilha de Lesbos do infernal campo de refugiados de Mória. Se eu encarasse a vida apenas de uma forma individual e pelo meu bem-estar eu ficaria na Grécia, não há outro lugar no mundo em que eu preferisse estar. Mas o que me fez sair da Grécia foi o mesmo que me levou lá: o facto de eu ser comunista e de eu entender este modo de ser como uma missão de vida, isto é indissociável de eu colocar os interesses colectivos comunistas e de classe proletária sempre em primeiro lugar. Penso que devo explicar o meu sentimento pela Grécia. Eu fui para lá porque admiro o Partido Comunista da Grécia em todas as suas dimensões (políticas, ideológicas e organizacionais, pela teoria e pela prática e pelo seu insuperável internacionalismo). E eu fui para lá também por causa da frente sindical militante, a PAME, que o KKE protagoniza que durante os anos da Troika e de maior impacto da crise de 2008 (creio que de 2009 a 2013) fez durante 4 anos uns 37 dias de greves gerais, algo que se aproxima de uma greve por semana (algumas delas em 2 ou 3 dias seguidos), e que se soma a dezenas e até a centenas de outras acções de luta nacional, regional, sectorial e local. Entre essas greves esteve uma greve de 9 meses numa fábrica metalúrgica que foi apoiada com fundo de greve e com inúmeras acções massivas de apoio pela PAME e pelo KKE. Começar a falar destas coisas é difícil porque a resposta que eu gostaria de dar seria do tamanho de um livro com tanta coisa a aprender (de facto a PAME tem um documento desse tipo que procura compilar as lutas desses anos. São as vidas de milhões de combatentes proletários gregos que me sensibilizam mas eu fui mais longe porque transpus o papel de observador e vivi com eles e vivi a sua luta ao nível humano do dia-a-dia, de colega, de camarada e de amigo. Fui muito feliz na Grécia apesar da dureza da luta. Acho que tive dois privilégios na vida que são fruto do meu próprio caminho: um foi encontrar o amor de outra pessoa durante algum tempo e outro foi o que vivi na Grécia que eu posso chamar do ponto alto da minha paixão pela revolução socialista. Na Grécia eu encontrei a esperança colectiva, uma esperança de classe e revolucionária e pessoas de uma grandeza que se aproximam do homem novo de que Che Guevara falava. A Grécia é o meu farol, a minha luz em tempos de trevas. Eu acredito que o KKE é o partido Bolchevique nos dias de hoje como vanguarda internacional. Isto quer dizer que acho que o KKE lidera o caminho revolucionário a nível do movimento comunista internacional e influencia outros partidos comunistas a seguirem o mesmo caminho que é o caminho mais rápido e mais consistente para a revolução socialista. Na Grécia, um comunista e um explorado nunca está sozinho, existe uma enorme solidariedade para todas as horas entre camaradas, e o KKE não está sozinho a nível internacional. Enquanto eu estive lá eu apoiei o KKE e a PAME com todas as minhas forças e uma das razões porque voltei é porque aprendi que a melhor maneira de ajudar o KKE é alargar a quantidade de partidos comunistas revolucionários, de camaradas de armas, dispostos a lutarem pelos irmãos proletários gregos em todas as horas e em todas as guerras. A outra razão porque voltei é porque trabalho com outros camaradas pela reconstrução revolucionária dos comunistas em Portugal e tenho de ter uma palavra especial para com camaradas com quem me dedico a traduzir livros revolucionários do KKE, da PAME, em defesa de Stalin e em defesa de outros partidos do pólo leninista e da história da luta comunista e do socialismo. A nova organização comunista alemã Kommunistische Organisation (KO) é um movimento que eu apoio com convicção pela forma inspiradora com um movimento comunista se reconstrói práticamente começando do zero em condições muito difíceis. A KO baseou a sua construção num processo que chamam de processo de clarificação para a discussão científica de temas controversos que o movimento comunista enfrenta. Eu considero este processo uma brilhante iniciativa de reconstrução do movimento comunista na Alemanha e que deve servir de exemplo para muitos outros movimentos comunistas pelo mundo que carecem de um partido comunista revolucionário. Para além de um brilhante nível ideológico das suas discussões internas e públicas eu destaco na KO o seu brilhante trabalho de defesa do socialismo da República Democrática Alemã (RDA em português e DDR em alemão) expresso no documentário "Das Andere Leben" (uma outra vida) que entrevista cidadãos da RDA que contrariam a propaganda dominante anti-comunista contra o socialismo da RDA. Quais são os teus sonhos para Portugal? Sonho com termos um partido comunista revolucionário em Portugal e com termos o correspondente movimento operário e sindical combativo, de massas e revolucionário liderando todos os movimentos populares dos explorados combativos e revolucionários, sonho com essa vanguarda e sujeito revolucionário porque sonho numa forma realista e revolucionária de sonhar. Eu gostaria de viver num país socialista mais do que ninguém mas sei que nada de libertador se alcança sem uma dura luta revolucionária. Sonho com que essa fraternidade comunista e proletária que encontrei na Grécia chegue a Portugal, sonho com estar sempre rodeado de solidariedade de camaradas em todas as lutas, em todas as horas e em todas as guerras. Sonho com um partido comunista para todas as estações e para todos os climas. Obrigado pelo teu tempo, votos de bom trabalho. Projecto Vidas e Obras Entrevista: Pedro Marques Correcção: Aristides Duarte

17 de Novembro de 2020

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