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Entrevista a Guilherme Antunes



Foi actor e é um estudioso da pintura e das artes em geral, num tempo em que se discute e se luta por 1% para a cultura, em que há graves problemas com os apoios através da DGARTES, do Estado, e com os apoios ao cinema, e ainda com a pouca programação cultural na TV. Como se pode mudar este paradigma e como se pode lutar pela igualdade e para se ser mais constante para quebrar este acérrimo ataque à cultura?

Como resposta imediata à primeira questão, apenas com um governo de esquerda se atingirá aspectos benéficos de desenvolvimento cultural. Por governo de esquerda, quero significar uma fatia determinante sob influência do PCP. Portugal não tem tido nenhuma tradição cultural no sentido de dar às novas gerações perspectivas de desenvolvimento intelectual e artístico nos mais diversos campos da História da Arte. É tudo aos repelões, não há um programa concebido para acautelar uma política dos saberes.

Repara que até o fascismo televisivo manteve uma noite de teatro semanal (que recordo muito bem), por exemplo, que ao longo de anos criou um público interessado. A tão falada exigência mínima de 1% para a cultura (é manifestamente pouco) é uma meta abaixo da qual a indigência marca pontos de desconstrução iminente de uma aprendizagem que, não se fazendo, cria guetos intelectuais que podem, perigosamente, derivar para extremismos elitistas, gerando sabedorias ínvias que facilmente não permitirão a clarividência necessária para distinguir o trigo do joio. Esta é a realidade medonha que se vive em Portugal há décadas, piorando sempre, apesar da Revolução e por causa da contra-revolução.

Se por comparação com a Itália ou com a Espanha, para não se avançar mais no território europeu, são povos habituados há muito a conviver com tempos fascinantes de erudição, como seja o famoso “Século de Ouro” espanhol, mas também o Grande Goya ou Picasso, o génio dos génios, por um lado; Dante e Petrarca, o “uomo universale”, o magnificente Renascimento, a estonteante arquitectura do Barroco, etc, permitem, apesar dos pesares, que haja um viajar imagético que pode ajudar a consolidar um colectivo compreensivo e amante do conhecimento minimamente estruturado.

Do meu ponto de vista, as realidades actuais nos diversos países da Europa jamais mudarão alguma coisa que seja, no sentido de maior desafogo para as massas. Tudo piorará porque tudo tem vindo sempre a piorar, não obstante os cantos de sereia e as ofertas de bolos com bolor com que o neo-liberalismo/fascista nos mimoseia através da troica nacional do P”S”, do PSD e do CDS.

Partilhou vários textos sobre o reformismo europeu e mundial e sobre o euro-comunismo. O que nos pode dizer sobre estes dois temas e como têm sido trágicos para o progresso do comunismo e para o combate total ao capitalismo e fascismo?

A questão histórica da traição de revolucionários que se deixaram corromper pelo excesso de passadeiras vermelhas que calcorrearam, deve obrigar os marxistas a uma vigilância constante e por serem acérrimos defensores da discussão nunca acabada no interior do Partido. Se da questão central do Comunismo é a formação ideológica dos seus quadros mais destacados, em especial, e de todo o Partido em geral, é bom de ver que a ausência desse formato organizativo trouxe ao MCI a tragédia da implosão soviética.

Foram os PCs latinos os inventores do famigerado euro-comunismo, que não é mais do que a proposta burguesa da consolidação de classes. Oficialmente foram os revisionistas franceses quem deram o pontapé de saída no abastardamento dos ensinamentos leninistas e na consolidação do Partido proletário, de classe, e sempre atento sob a liderança de Stalin. Em boa verdade, o “euro-comunista” Khrutchev já tinha dado o mote quando caracterizou a URSS como uma “sociedade socialista de todo o povo” e por conclusão elementar, já não a pátria do proletariado e do campesinato. Carrillo foi um bandoleiro das ideias e um pirata cobarde (basta que se leia, pelo menos, o livro de H. Lister). Berlinguer foi um cavalheiro elegante, de esmerada educação, um aristocrata vermelho qb., que propiciou ingloriamente a destruição completa do mais poderoso Partido comunista da Europa Ocidental.

Considerando o que sabemos hoje devido à possibilidade de consulta dos arquivos soviéticos, aprendemos que a diabolização de Stalin começou no interior do PCUS, através da canalha burguesa que se foi instalando após a morte do Grande marechal. A historiografia marxista é abundante em desconstruir o edifício anti-estalinista e anti-socialista que, já abertamente, critica a liderança politico/ideológica do próprio Lenine. Quando não, mesmo, a de Marx. Também já não são poucos os historiadores que nada tendo que ver com a Revolução Socialista de Outubro e muito menos perfilham proximamente esses ideais, acolhem com honestidade académica a grande realização soviética da sociedade.

Os dias de hoje obrigam os PCs a duas componentes essenciais, a meu ver. A primeira, é que deve retomar com a urgência para ontem uma formação ideológica exaustiva, sistemática, culta e dada por alguém melhor do que um mero funcionário papagaio da cassete conveniente. A segunda, não pode prosseguir com discursos para o povo desfasados da prática objectiva com que se compromete com outros sectores não democráticos e anti-revolucionários, numa visão despropositada de uma frente política inventada e mesmo reaccionária, já que está longe de liderar o processo de resistência.

É um cronista diário e activista político. Como vê os vários golpes no Brasil, na Venezuela, este enorme ataque dos Estados Unidos e Israel? E todos os passos dados pelo capitalismo através do negócio de armas, as guerras, os domínios nas sementes, no controlo através da internet, TV, golpes em governos? Como é que as forças comunistas e anti-capitalistas podem duma vez acabar com este enorme ataque ao progresso do mundo, da natureza, da liberdade?

Este terceiro ponto é fundamental. Naturalmente, que não sei qual a solução para erradicar os avanços notados da extrema-direita por todo o mundo, em total conluio com a chamada social-democracia, que em boa verdade é, nem mais nem menos, que o neo-liberalismo por excelência. Sei, porém, que esta deriva humana será derrotada, inevitavelmente, pelas forças produtivas unidas em moldes do Socialismo/Comunismo.

Evidentemente que estamos a assistir ao estertor, cada vez mais notório, do capitalismo, que por via disso mesmo desenvolve organicamente a sua radicalidade consubstanciada na ineficácia da sua dialéctica e que recorre historicamente ao fascismo e ao nazismo.

Penso na inevitabilidade de uma guerra mundial nos moldes mais clássicos, mais mortífera e que pode descambar a todo o momento. Nenhum império se vai abaixo sem luta, a tirania jamais se rende sem aumentar o caudal sanguinário da sua acção opcional. Imaginar que a sociedade socialista pode dar passos seguros de conquista sem sangue é uma desonestidade do circo de pseudo-comunistas que grassa pela Humanidade. Em nenhum momento da história as classes subalternas se rebelaram sem violência e jamais venceram sem levar a missão até ao fim; extirpar a classe opressora, destruir-lhe o poder exercido maleficamente, erradica-la da face da Terra.

O acontecimento recente no Brasil com a eleição do bolso-coiso é trágico. Já se fala numa coligação ideológica entre os Estados fascistas do Brasil e da Colômbia contra a Venezuela. Esta é uma possibilidade concreta do desencadeamento de guerra mundial que falei atrás. A dar-se esta envolvência de três importantes Estados regionais, faria disparar o internacionalismo cubano ali à porta.

É fundamental que todos os comunistas especialmente, mas todos os homens e mulheres de esquerda se empenhem na luta pela Humanidade, pela salvação da vida no planeta. A militância de cada um é vital se analisarmos a discrepância entre as possibilidades da nossa intervenção e o poderio, jamais igualado, da propaganda do império, que detém 90%, pelo menos, das notícias que correm pelo mundo a velocidades supersónicas. Penso que a ferramenta do feissebuque deve ser usada com critério denunciador e deveria acautelar-se uma melhor resposta organizada no âmbito partidário dos Partido comunistas.

Tem dedicado muita pesquisa e leitura a Stalin. Como foi e é importante o papel de Stalin para a URSS, o caminho do Marxismo Leninismo, o caminho para o socialismo? Hoje ainda muitos militantes comunistas e partidos comunistas odeiam Stalin. Como se criou este fantasma do horror a Stalin e o que podemos e devemos aprender sobre ele e a sua obra? E como se pode mudar essa visão de criminoso?

A cobardia e o arrastamento da falsidade contra-revolucionária iniciada com Khrustchov “y sus muchachos” deu início no seio do Partido bolchevique através da traição mais abjecta e jamais travada na sua totalidade, até à chegada do cão-traidor vindo do interior do PCUS, o lacaio burguês da gorbatchoviana 5ª coluna estadunidense, é um dado mais que conhecido e estudado que coloca o anão Gorbatchov como uma das mais repelentes criaturas sub.humanas em contacto com os terráqueos.

O analfabetismo com décadas de que são vítimas milhões de camaradas em vários Partidos comunistas, que têm do camarada Stalin uma visão diabolizada, religiosamente por Partidos rendidos aos princípios da traição e da ignomínia, devem vir a ser responsabilizados pela sua contribuição para o reforço da contra-revolução em que se insere de forma insofismável o PCP e a sua recusa sistemática de ousar, sequer, fazer a discussão que o obriga ao revolucionário marxista mais consequente que a História do Socialismo reclama da Humanidade progressista.

A central repugnante anti-estalinista tem início, com naturalidade, na propaganda alemã do nazismo. É transferida de armas e bagagens na linha da traição de Trotsky (excelentemente assassinado) e na conquista ideológica dos serviços secretos estadunidenses. Não há rigor histórico, não há comprometimento com a verdade conhecida mesmo por elementos capitalistas ao serviço do grande irmão. As realidades extraordinárias como o Socialismo respondeu à destruição inimiga, abundantemente documentada por Churchill ou por Roosevelt, por exemplo, dá uma ideia tresloucada da mentira erigida em fonte sacrílega e imutável.

A herança nazi foi retomada pelo grande irmão imperialista e anti-comunista estadunidense, irmão gémeo do ódio contundente que fez da guerra-fria o combate “templário” da cruzada religiosa contra os infiéis. A imensa superioridade da sociedade socialista impunha-se pelos números da produção quinquenal, em comparação pobre com os resultados menores (os possíveis aquela organização de sociedade) da maior mentira planetária com orientação capitalista.

Só o estudo da história acompanhado da exigência revolucionária marxista pode aquilatar consequentemente da capacidade histórica e da construção da consciência proletária e socialista, como uma resposta erecta e corajosa de fazermos afirmar os ideais superiores pelos quais tantos de nós, os melhores de nós, deram a vida. Sejamos nós dignos dessa herança e estejamos receptivos a arredar toda a espécie de canalha golpista e anti-comunista que se encontra instalada no interior dos nossos Partidos comunistas reformistas e anti-estalinistas.

Esteve na UDP. Como vê o declínio da UDP, do PCR e de outros pequenos partidos que foram criados durante o PREC como partidos revolucionários e a criação de partidos reformistas desde o declínio destes partidos?

Nunca estive na UDP. Simpatizei, contudo, com esta força política até à eleição de Otelo, em quem lamentavelmente votei. Com a excepção da UDP, todos os outros inúteis partidos prejudicaram profundamente o desenrolar do processo revolucionário, nomeadamente na influência perniciosa que conseguiram junto de alguns sectores militares; despolitizados, esquerdizados e na sua consequência, comandados pela CIA via P”S”/Soares e toda a reacção portuguesa, tiveram o seu desaparecimento quando o capital deixou de precisar dos prestimosos serviços de combate contra a Revolução socialista que se tentava construir no nosso país e, muito especialmente, no combate privilegiado feito ao PCP.

Com naturalidade e sem originalidade, toda essa gente, na sua imensa maioria, rumou a outras vidas, largaram essas “criancices próprias da idade” e lá foram para as carreiras burguesas para que estavam fadados, no cumprimento classista das suas origens. Pequeno-burgueses da província, uns, com algo de seu; intelectuais de pacotilha, outros, intrinsecamente anti-comunistas com “uma vida tão bonita à sua frente” e a burguesia mais estúpida da Europa, como alguém lhe chamou, pronta e ávida por realizar o assalto às prebendas que estavam mesmo ali à disposição, para quem não tivesse nenhuma relação com a dignidade, para quem apenas o que contou foi a noção rigorosa que o Estado estava a saque e que corrompendo tudo o que fosse preciso, meteoricamente chegariam ás principescas fortunas que hoje são um dado inalterado da “democracia” nacional.

Quais são os seus sonhos para Portugal?

O sonho que quero que aconteça em Portugal, provavelmente sem eu o ver, é a vitória da Revolução socialista e a implantação de um governo marxista que honre e compreenda todo o glorioso passado das conquistas inigualáveis do movimento comunista internacional, na referência incontornável da Grande Revolução Socialista de Outubro.

Obrigado pelo seu tempo, votos de bom trabalho.

Projecto Vidas e Obras Entrevista: Pedro Marques Correcção: J.M.

01 de Novembro de 2018

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