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Entrevista a Guilherme Antunes

Como é que viveu o tempo do PREC, o 25 de Abril e os anos com o “Botas Cardadas” e o Marcello Caetano?

De forma muito intensa e feliz, convencido que podia mudar o mundo em breve. A Revolução foi o momento mais importante da minha vida, junto com o nascimento do meu filho. Quando o “botas” se foi eu já tinha consciência política e era membro do TEC, em Cascais, o que ajudou a reforçar a noção de que era urgente uma Revolução, que não chegou, infelizmente, antes de eu ter ido para a guerra de África.

É frustrante para si ver que os sonhos de Abril não se cumpriram e que a grande maioria dos direitos estão a ser roubados e a constituição abafada com apresença do FMI/Troika?

Sim, muito. Tantos sonhos desfeitos, Portugal era um farol notável para toda a Europa e o mundo. A Revolução dos Cravos era elogiada em todo o lado. Mas jamais pensei, muito pelo contrário, que estava tudo perdido e era irreversível a má vida do povo e as traições acumuladas. É preciso, como respirar, continuar a luta pelo Socialismo, única forma de restabelecer alguma dignidade ao ser humano lusitano.

Que lembranças tem do tempo em que esteve no Teatro e que actuou com os Enormes Mário Viegas e Orlando Costa?

Fui fraternalmente amigo de ambos. O Mário dividia o camarim comigo e falávamos bastante. O genial jovem actor que já era, possuía já uma óbvia noção de luta contra o fascismo, bem como o Orlando. O choque pela perda do Mário é terrível para Portugal, porque é uma figura cimeira da sua cultura.

Como vê este tratamento que tem sido dado ao Teatro e, em geral, à cultura? Esse sonho de representar veio de muito cedo?

Fui sempre um jovem curioso da leitura, comecei a ler muito novo na bibliotecados condes de Castro Guimarães, que se encontra num parque muito bonito em Cascais. Comecei a ler teatro por volta dos 14/15 anos e aos 17 proporcionou-seum convite de duas amigas que lá pertenciam (ao TEC) a ir prestar provas. Não foi exactamente um sonho, foi uma oportunidade que surgiu e que aproveitei em boa hora.

Quando é que surgiu o interesse em estudar e escrever sobre a actualidade? Esobre a história e posições da Igreja, os Estados Unidos, a União Europeia, etantos outros assuntos?

Por essa altura que referi atrás comecei a tomar notas sobre as questões do teatro, mas com intervenção escrita pública, logo a partir da Revolução e da necessidade que sempre senti de fazer (ou tentar) “passar a mensagem”. Gosto de História desde a escola primária e senti sempre que precisava de compreender o caminhar da Humanidade para a poder discutir, tão bem quanto possível. Desde a adolescência que não há dia nenhum que não leia livros ou artigos sobre História e política de que é feita a minha vida intelectual.

Sente que é importante partilhar informação com os outros?

Só assim se justifica saber coisas.

A história está a repetir-se?

Não. Embora os pressupostos essenciais da luta de classes se mantenham semelhantes no fundamental. A Revolução e a reacção fazem parte do movimento da luta de libertação do homem.

Para que caminho vê que o PS, PSD e CDS BCE CIA nos estão a levar?

À escravidão mais abjecta. Lamentavelmente os povos têm muita dificuldade em discernir sobre o seu salvamento. Essa inércia custará à Humanidade muito sangue e muita morte. Há programas políticos imperialistas conhecidos de chacinas intencionais de grandes partes das populações mundiais que o capitalismo prossegue inalterado e de acordo com a raíz objectiva da sua existência.

Como se pode fugir deste paradigma?

O capitalismo é apenas uma fase na história da Humanidade, a que se lhe seguiráo Socialismo. É através da Revolução de processos sociais diferentes que sairemos deste atoleiro. O capitalismo nada tem a oferecer aos povos a não serdesemprego, infelicidade, fome, guerra e morte por indigência na maior parte.

O que tem aprendido com estas viagens pela história política? Pela viagem à URSS, pelo estudo de Lenine, Estaline?

Com excepção da URSS, sempre que viajo é na perspectiva da História de Arte. Evidentemente que a história de arte é uma maneira mais sofisticada de encarara história deste ou daquele país, desta ou daquela realidade social. As viagens são influem em nada nas minhas leituras, que são ditadas pela vontade que tenhode saber sempre mais.

Tem saudades do Palco?

Dantes pensava nisso, há muito que não. O teatro em Portugal degradou-se muito e só se vê são esses e essas patetas das telenovelas de plástico.

Revolta-o que muitas pessoas digam que era positivo vir um novo Salazar? O Passos não é o novo “Botas Cardadas”? E que resultados tem este tipo de políticas? Esse paradigma de dizer que Salazar tem de voltar, e que todos os políticos não prestam, que há funcionários públicos a mais, o descrédito em relação à cultura, tem de mudar?

Lutarei contra essa ideia até ao meu último dia de vida. Portugal hoje tem um governo fascista. É preciso mudar e para isso é urgente dar mais força à CDU.

Que direitos é que foram conquistados e perdidos desde o “Botas Cardadas”, e o “Sr. Bochechas” e os partidos PS, PSD CDS?

Portugal anterior a 1974 era uma coisa escura e mal frequentada em que se dizia que ser pobrezinho e honrado era tudo o que precisávamos, que não estávamos preparados para a democracia, etc. A troica nacional, hoje, são os filhos directos do fascismo e estão à solta.

Como é que viveu aquele tempo da Ditadura de Salazar (o Botas) e Caetano? A ex-deputada Odete Santos referiu num programa que não vivemos em Democracia, concorda?

Concordo. Não vivemos em nenhum estado de direito democrático, mas sim em ditadura do capital e de forma selvática.

Com Mário Viegas e Orlando Costa, estavam na rua a conversar e foram intimados por dois gajos que disseram para sair dali, pois era proibido conversar àquelas horas. Desafiaram muitas vezes a autoridade policial e dos bufos? Hoje mesmo havendo liberdade de expressão, e que se pode falar, vale de alguma coisa? Interessa muito que se fale, que liberdades se perderam, ou deque forma é que esta liberdade de se falar é tomada como ponto a favor do governo?

Naquela altura tudo era proibido, até o sol, por vezes, quase que ficava enclausurado. A liberdade de expressão que diz haver hoje é extremamente condicionada e em boa verdade ela não existe. Pode um cidadão opinar à suavontade, mas é-lhe negada essa possibilidade nos locais onde é fundamental: os meios de comunicação social. E aí, pelo menos 90% do que sai é falso. E o tom político é arrasadoramente troicano, restando “piriscas” para os outros.

Como actor/artista que foi, vê o projecto/manifesto “um por cento para acultura” como uma luta louvável?

Claro que sim, muito louvável. Um país sem cultura é um amontoado de marionetas sem sentido. Que não treina o pensamento e que não lhe permite nenhum tipo de evolução. Até porque não tem condições intelectuais de fazer escolhas.

O que ainda é preciso fazer pela cultura, escola, teatro, pela informação? A luta urge para essas áreas da sociedade? É necessário que todos se unam comurgência?

A cultura é, do ponto de vista do Socialismo, a questão número um a arrancar ea manter com desvelo inultrapassável. Uma Revolução social só se mantém vitoriosa e fresca se a cultura colectiva de um povo for absolutamente acessível e territorialmente abrangente. Cheguei a comunista pela cultura e pela sensibilidade, o estudo da política e dos seus clássicos chegaram a seguir.

Como é que se consegue voltar a unir muitos artistas e outros como na Manifestação de 13 de Outubro – “Que Se Lixe a Troika – Manifestação Cultural”? E como vê o crescimento das manifestações por esta organização?

Ao longo de décadas, durante o fascismo, toda a intelectualidade portuguesa era comunista ou seus “compagnons de route”, ainda que com raríssimas excepções. O imperialismo detém, praticamente, todos os meios de comunicação. A derrota da URSS e do bloco socialista é uma tragédia de que são conhecidos números dramáticos de recuo civilizacional. O imperialismo só tem guerras e fome a dar aos povos. As manifestações a que se refere são conjunturais, têm pouco significado político, embora muito apoio publicitário. Por isso mesmo vimos vários ministros tão compreensivos com elas e não desdenhando integrá-las, embora saibamos que não o fariam. Penso que são erradas, mas que devemos estar atentos a elas, pois comportam vários milhares de pessoas. Mas o que querem dessa amostragem? Quem dirige aquilo? Que objectivos perseguem? Que lutas consequentes organizam? Para onde vai toda essa energia solidária de tanta gente nova e honesta? Que se espera que saia de um conjunto de gente inorgânica que até pode ser do PSD, mas que também são anarquistas e bloquistas, de extrema-direita ou de gente que se orgulha de jamais ter participado numa?“ Tantas perguntas, quantas respostas”, dir-nos-ia o Brecht.

Quais são os seus sonhos para Portugal?

A vitória do Socialismo!

Obrigado pelo teu tempo, votos de bom trabalho.

Projecto Vidas e Obras

Entrevista: Pedro Marques Correcção: J. M

06 de Abril de 2013

05 de Abril de 2013

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