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Entrevista a Catarina Oliveira – Activista Pelos Direitos Da Pessoa Com Deficiência



Tem-se deparado no dia-a-dia com barreiras de acessibilidades “atitudinais” físicas. Que impacto têm estas enormes barreiras e a falta de acessibilidades?

Existem de facto diversas barreiras com que nós pessoas com deficiência se deparam no dia-a-dia. Desde barreiras físicas (degraus, falta de elevadores, pisos irregulares, wc não adaptados) mas também barreiras de atitudes da sociedade para connosco pessoa com deficiência desde : infantilização, super proteção, etc.

Todas estas barreiras são altamente limitantes para a pessoas com deficiência pois impede a mesma de experimentar o mundo de forma igualmente completa. Eu já fui uma pessoa sem deficiência e sei que as minhas vivências no mundo hoje, enquanto pessoa com deficiência, são muito diferentes e bem mais limitadas.



De que forma é possível combater esta invisibilidade e as barreiras de acessibilidade e as pessoas com deficiência poderem circular e viver com independência?

Para que se combata esta invisibilidade é preciso promover a representatividade da PCD em todas as áreas da nossa sociedade. Dar espaço à PCD para frequentar todos os espaços para que esta possa ser vista e lembrada porque só assim iremos ver as mudanças no sentido da construção de um mundo mais inclusivo e acessível.


Através do seu canal do youtube “C Feliz” tem feito vídeos para relativizar a questão de se ser pessoa com deficiência, e naturalizar a questão da vivência das pessoas com deficiência. Desde que começou com os vídeos que mudanças tem sentido e o que falta ainda fazer?

Hoje em dia confesso que o meu trabalho é praticamente todo no Instagram na minha página @especierarasobrerodas onde partilho mais conteúdo sobre a deficiência e o fim do capacitismo. Tenho sentido que o meu trabalho tem surtido o seu efeito principalmente em pessoas sem deficiência que por não passarem pelas mesmas coisas que nós PCD no dia a dia não estão tão conscientes das nossas problemáticas. Eu acredito muito que só falando sobre os assuntos como eu faço nas minhas redes sociais é que vamos, por assim dizer, agitar as águas e promover alguma mudança.


Em entrevista para o “Viaje Comigo” refere “Que a acessibilidade deve ser pensada à partida” Em que medida facilitaria e mudaria a vida das pessoas com deficiência?

Sim, é muito comum vermos projectos a serem desenvolvidos onde a acessibilidade não é sequer considerada ou se é, é apenas na fase final do projecto quase como última opção. A acessibilidade é essencial para que a PCD possa usufruir do mundo de forma equitativa à pessoa sem deficiência pois sem ela muitos locais ficam completamente inantigiveis para a PCD.


Tem esta frase escrita no instagram “Por cada vez que pensares que o meu maior desejo é voltar a andar constrói uma rampa. Agradeço.“ A partir deste seu lema, e deste murro na mesa, acredita que pode mudar essa mentalidade das pessoas sem deficiência?


Acredito que pelo menos pode rodar alguma chavinha na cabeça de algumas pessoas. Muita gente vê uma pessoa numa cadeira de rodas e acredita que o maior desejo dessa pessoa é voltar a andar, que essa pessoa só pensa nisso, só vive para isso. E não é esta a realidade de todo. A nossa vida continua em cima de uma cadeira de rodas, não está em stand by até voltar a andar. Se voltarmos a andar. Isto é um pensamento muito comum mas que eu gostava muito de ver desconstruído.


Fala em várias entrevistas do “capacitismo” – preconceito contra a pessoa com deficiência. E da infantilização das pessoas com deficiência. Como é possível combater tanto o preconceito como a infantilização?

Falando sobre os assuntos. Expondo as situações que vivemos de infantilização, de pena, de caridade, de super protecção. Muita gente quando se apercebe das situações pelo meu instagram seja nos meus vídeos ou nos meus posts percebe o quão erradas algumas atitudes são e daí é que pode ocorrer a mudança.


Como tem sido para si dar voz na missão de desconstruir preconceitos, barreiras, capacitismo, desde que a trabalhar estas questões no instagram? Que mudanças tem sentido e desde que começou a pandemia como é que tem visto e sentido a situação com que são tratados, as condições, os apoios, os desconfinamentos que muitas pessoas com deficiência não conseguiram ter?

Para mim é um privilégio poder trabalhar com assuntos que me dizem tanto no meu dia-a-dia enquanto pessoa com deficiência. À minha volta já vejo bastantes mudanças, nomeadamente nas atitudes e na percepção do mundo das pessoas que me rodeiam, quer pessoalmente quer virtualmente. Embora veja estas mudanças sei que o caminho é muito longo e tortuoso e que são precisas mudanças sistémicas para que se construa uma sociedade verdadeiramente para todos.

Quanto à pandemia, este confinamento que muita gente sentiu pela primeira vez na pele, muitas PCD já sentem aos anos e não vão deixar de sentir quando a pandemia acabar. É preciso alertar para que muitas PCD estão fechadas em casa há anos porque não tem condições de acessibilidade para sair de casa, para se movimentar na rua, para ir para o trabalho, etc etc. O confinamento agora foi para todos mas há anos que PCD conhecem esta realidade.


Desde que começou a desenvolver o seu canal “C Feliz”, o projecto “Espécie Rara Sobre Rodas” e como Embaixadora da Associação Salvador o que tem aprendido e que importância tem para si todo este trabalho de luta, de apoio, de consciencialização, de denúncia? E o que nos pode dizer mais sobre os seus projectos e o seu trabalho?

Tenho aprendido muito com todos os que me rodeiam em todas as esferas da minha vida pessoal e profissional. Eu própria me entendi como capacitista porque cresci numa sociedade capacitista e ainda por cima fui a maior parte da minha vida uma pessoa sem deficiência. Trabalhar com quem trabalho, movimentar-me nos meios que me movimento faz com que cada vez mais eu própria possa desconstruir o meu capacitismo.

Hoje em dia o meu trabalho passa muito pela Nutrição e pelo meu Instagram @especierarasobrerodas. Para além disso, como embaixadora da Associação Salvador tenho tido a oportunidade de participar como palestrante em eventos em empresas, escolas, etc onde posso falar sobre o capacitismo, a acessibilidade, inclusão e diversidade.


Quais são os seus sonhos para Portugal?

Não lhes chamo sonhos porque acredito que serão realidade. Quero que Portugal abra a sua consciência e comece a ver realmente todos os portugueses. Somos cerca de 11% da população, pessoas com algum tipo de deficiência ou limitação, não somos assim tão poucos. E mesmo que fossemos. Sou cidadã, trabalho, tenho os meus deveres e também quero ter os meus direitos. Quero que Portugal entenda os DIREITOS da PCD como isso mesmo, DIREITOS e não PRIVILÉGIOS.





Obrigado pelo seu tempo, votos de bom trabalho.


Projecto Vidas e Obras

Entrevista: Pedro Marques

Correcção: João Aristides Duarte

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