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Entrevista a Ana Barradas

Publicou textos sobre o reformismo e sobre euro-comunismo no facebook, e https://bandeiravermelhablog1.wordpress.com/. Que opinião tem acerca destes dois temas, como têm sido trágicos para o progresso do comunismo e para o combate total ao capitalismo e fascismo?

Os partidos de esquerda que existem entre nós têm trabalhado para uma acumulação de forças não revolucionárias, com métodos de luta que não dispensam a colaboração de classes e o apoio às reivindicações da pequena burguesia. Conjugada esta táctica com a invisibilização dos proletários, dos marginalizados e dos discriminados, fica posta de lado a luta directa contra a exploração capitalista, substituída por campanhas basicamente mediáticas em prol de lutas sectoriais que, ainda que importantes, em nada abalam os poderes da classe dominante. Só servem para desarmar o ânimo dos que, para se libertarem da exploração, precisam de uma política abertamente anti-sistema, que golpeie o capitalismo no seu âmago. Esta é a tragédia dos dias de hoje, que abre o caminho para regimes mais autoritários e para a perda gradual de direitos conquistados no passado por meio de combates radicais, como aconteceu no período revolucionário de 1974-75.

A política eleitoralista das candidaturas de “esquerda”, que tudo subordinam a favor de obtenção de posições no contexto do sistema social-democrata, é puro reformismo, sem qualquer veleidade de radicalismo. São estes os lamentáveis frutos podres desta nossa época.

Desde o desaparecimento físico do comunista Francisco Martins Rodrigues que tem promovido o trabalho político que deixou, a obra escrita e o pensamento comunista. Para si, trabalhar e mostrar a sua obra, como é que pode ser uma aprendizagem em termos políticos, humanos, culturais e marxistas?

Esforçar-me por tornar mais conhecido o pensamento avançado de FMR é trabalho paciente, feito a pulso, sem resultados espectaculares nesta fase de ascenso da direita e deslizamento do reformismo para posições cada vez mais rebaixadas. Mas é muito gratificante, porque vai sempre produzindo novas ideias e novas interacções, uma disposição renovada para encarar de frente a falência das fórmulas que levaram ao soterramento do marxismo-leninismo e a necessidade de recomeçar tudo numa base de princípios. E sobretudo porque, passados estes 11 anos sobre a morte do Chico Martins, aquilo que deixou pensado, feito, dito e escrito continua a ser de extrema actualidade, sem perda de fulgor.

“Ministros da Noite - Livro Negro da Expansão Portuguesa”; “Dicionário Incompleto de Mulheres Rebeldes/ Dicionário de Mulheres Rebeldes”; “As Clandestinas”, “O Império a preto e branco”. Tem estes livros sobre o colonialismo, a luta das mulheres na ditadura do Estado Novo, como é importante abordar o colonialismo, a luta das mulheres, as agruras do Estado Novo, o esquecimento e deturpação da história do Estado Novo e do colonialismo? Hoje como vê as mulheres na UE?

A repressão, o racismo, a xenofobia, a discriminação, o neocolonialismo e a opressão da mulher… tudo isso é o produto incessante do desenvolvimento capitalista, que só se extinguirá com o surgimento de um novo sistema de produção. Para aproximarmos esse momento de sublevação total contra as taras da nossa sociedade tão atrasada, há que estar sempre em crítica, em luta e em oposição, encontrando novos caminhos, buscando novas energias nas pequenas vitórias que se podem ir alcançando. O feminismo é uma faceta dessa ampla frente de batalha, e também aí impera, na EU em geral e também em Portugal, uma abordagem reformista, com várias cambiantes, velocidades e objectivos, mas sempre dentro da ordem estabelecida. É preciso contrapor a esta onda que reforma, mas não transforma, uma postura intransigente de defesa dos interesses e necessidades das mais exploradas, esses que estão no olho do furacão da opressão e exploração capitalistas e que só se poderão libertar de tutelas se se guiarem pelos seus interesses próprios.

http://cemflores.blogspot.com/2016/06/o-caminho-e-para-frente-ha-que-retoma.html Nesta sua carta ao Colectivo Cem Flores fala sobre a forma como o capitalismo controla os governos, de como pode destruir o ambiente, do espezinhar dos direitos, que como diz ”reina o medo, o desânimo e a descrença na capacidade de mudança.” Na sua perspectiva o que falta para uma maior clareza, união e combate perante o capitalismo? Como é que estes controles, ataques a direitos, entre outros, podem prejudicar os trabalhadores, os povos, os pobres?

O que falta é trabalhar para acabar com esta organização social no seu todo. Excusarmo-nos a essa necessidade é desperdiçar o sentido da vida. A militância por esta nobre causa liberta-nos de sermos joguetes dos que nos oprimem. Têm sido muitas as derrotas e desastrosa a actual fase de dispersão. Mas a revolução é um longo processo ininterrupto e é por aí que vamos encontrar o caminho.

Tem várias publicações sobre a Revolução de Outubro e várias transcrições que fez do Francisco sobre Stalin. O que significam para si, o que podemos aprender com Stalin que liderou a Ex-URSS e a Revolução? Para si o que tem falhado na aprendizagem sobre a União Soviética, para que hoje a realidade esteja envolta de reformismos, euro-comunismos, revisionismos e oportunismos? Para si, de que forma é possível quebrar com esta realidade?

Mais que exaltar ou não o controverso papel de Staline, acredito que o importante é chegarmos a entender como superar o fracasso das primeiras experiências socialistas (na Rússia, na China, etc.) de que maneira novas tentativas, mais avançadas, poderão influenciar positivamente o processo histórico, agora com perspectivas tão negras. É preciso remar contra a maré, manter pé firme, agrupar um núcleo revolucionário, acabar com a rendição e a passividade, ter um programa de acção que faça sentido. Sem isso, estaremos entregues à barbárie imperialista e aos dúbios e tíbios reformismos de todos os matizes que prolongam a existência do capitalismo.

Quais são os seus sonhos para Portugal?

Tenho sonhos para o mundo, com Portugal lá dentro. Sonho com um mundo em que os produtores possam por fim apropriar-se do que produzem e, com a maior das liberdades, estejam à altura de distribuir por todos a riqueza que geram, de acordo com as necessidades de cada um. Para finalmente “podermos viver como seres humanos”, como dizia o Chico. Não é muito, é o mínimo que se pode desejar.

Obrigado pelo seu tempo, votos de bom trabalho.

Projecto Vidas e Obras

Entrevista: Pedro Marques Correcção: Mário Martins

19 de Fevereiro de 2019

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